Gisele da Cruz Vasque
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UUCG
O desenvolvimento humano está fundamentado em sua relação
com a natureza, como também, com outros semelhantes a si. Relação esta, construída
gradativamente no decorrer histórico,tendo por suas bases o desenvolvimento de
um em detrimento de outro, compondo assim, o tema de nossa discussão.
Com
sua racionalidade e através de instrumentos e técnicas adquiridas
historicamente, o homem sobrepõe-se à natureza extraindo recursos que ela lhe
oferece, a fim de satisfazer seus desejos e necessidades. E no sentido de
atender estas necessidades aprimora suas tecnologias, criando “objetos sociais
e abstratos”, como por exemplo, o mercado ouo desenvolvimento industrial. E
nessa simbiose, nasce a necessidade de conhecer o espaço em que se vive para
que, assim, possa domina-lo e consequentemente, dominar e transformar a
natureza, como é observado no discurso de Douglas Santos (2002):
[...]
a identidade do indivíduo realiza-se na construção da identidade dos lugares,
podemos afirmar que a construção cultural da humanidade é, entreoutras coisas a
construção de sua geografia.
Entendendo que o ato de localizar-se
(ou perder-se) impõe uma unidade entre a objetividade/subjetividade humana e
sua alteridade – o não humano, as marcas territoriais conhecidas contra as não
conhecidas, o significado operacional e mítico de cada ato/lugar, dividindo na
diferencialidade dos lugares os trabalhos necessários à sobrevivência – pode-se
dizer que a construção do discurso geográfico antecede o histórico (como
discurso) [...]” (p.23-4)
“Espaço
e tempo, da forma como hoje os concebemos, são a sistematização simbólica
criada pelas e através das
transformações advindas do desenvolvimento da sociedade burguesa [...]. Produto
e condição do processo, o que pensamos ser espaço e tempo são, na verdade, a
ferramenta que possuímos para sistematizar a nossa relação com o mundo da
maneira como hoje ele se representa. [...] (p.29).
Neste
contexto conclui-se que a atividade humana é fundamentada na relação social e
na coletividade, ou seja, o homem não vive só, é um ser social e seu
desenvolvimento codepende de sua relação entre espaço e natureza, sendo algo
construído historicamente de modo gradativo e espontâneo ou manipulado.
Na
prática da produção, o homem se depara com uma relação dicotômica simultânea.
Produção compreende a domínio, porém, compreende também à alienação. O primeiro
está ligado à transformação de domínio da natureza e o segundo a sua própria
produção como discorrido por Douglas Santos (2002):
[...] O mundo da acumulação,
que só se torna praticamente possível na medida em que conquista o controle
sobre a dinâmica das coisas, criou, a seu favor, o discurso da “transformação”,
pois a mera descrição é incompatível com um processo produtivo que, cada vez
mais e melhor, deve colocar tudo de que dispõe – como matéria-prima, máquina,
força de trabalho, etc. – a serviço da produção e reprodução ampliadas dos
processos de apropriação do trabalho [...] (p.29).
Como
em todas as relações humanas, na produção não seria diferente. Em análise aos
fatos históricos de seu desenvolvimento, o homem sempre produziu e produzirá em
detrimento de algo, como por exemplo, a construção social e econômica de um
Estado-Nação, que para seu desenvolvimento pleno, fundamenta-se na exploração
tanto de seus recursos naturais (ou do país vizinho), como de recursos humanos,
ilustrando-se com o exemplo da escravidão, ou em nossos dias a exploração do
trabalhador assalariado, que por sua vez, produz transformando e explorando a
natureza, mas em contrapartida é explorado através de seu trabalho.
Pode-se
afirmar que o apogeu da relação entre natureza-homem-economia, deu início na Revolução
Industrial, cujo momento foi caracterizado pelo início do capitalismo,
propriamente dito, aumento considerável da produção através do avanço
industrial e tecnológico e urbanização da população.
O processo de acumulação,
que foi acelerado entre os séculos XVI e XVIII com a exploração colonial no
Europa ocidental, converge na implantação do sistema fabril, no final do século
XVIII, na Inglaterra, através da canalização de investimentos no setor
industrial.
A
chamada Revolução Industrial não consistiu apenas no emprego da máquina na
produção, substituindo o trabalho manual. O expressivo crescimento da produção
eliminou logo as formas anteriores de apropriação do trabalho, baseadas no
controle do Estado e das corporações. (OLIVEIRA,1995, p 77).
O
avanço tecnológico, por sua vez, exige o emprego de mais máquinas,
consequentemente, menos uso de mão-de-obra. Fato que se deu início na Revolução
Industrial e presente até os nossos dias atuais, citando como exemplo, a
substituição dos trabalhadores que lidavam no manejo da cana-de-açúcar por
máquinas de corte e colheita cada vez mais modernas, sendo que uma máquina
substitui a mão-de-obra de 100 trabalhadores, gerando, simultaneamente, lucro,
agilidade na colheita e desemprego.
Os
trabalhadores descartados deste processo nem sempre são realocados, formando
uma reserva disponível, pronta para ser usada a qualquer momento, conforme as
necessidades apresentadas pelo mercado. Estratégia usada pra manter os salários
baixos e sempre ter disponibilidade de mão-de-obra, possibilitando assim, o crescimento
do mercado, sem que haja a preocupação com oferta de mão-de-obra.
Este
excedente assombra o trabalhador formal que para manter seu emprego, submete-se
a intensas horas de trabalho comprometendo sua qualidade de vida.
Assim
traça-se o perfil do trabalhador assalariado: um homem miserável assombrado
pela possibilidade se sua expulsão através do avanço tecnológico (substituição
de sua força de trabalho pelo uso de máquinas) e pelo excedente de mão-de-obra.
Para
atender as demandas geradas pelo desenvolvimento da indústria, os países
desenvolvidos, fornecem tecnologias agrícolas e técnicas de higiene aos
subdesenvolvidos, para que assim, estes possam lhes fornecer produtos de
qualidade. Estratégia que resultou em um grande aumento da população destes
países, pois sua taxa de mortalidade diminuíra, mantendo a taxa de natalidade.
Diante
disto, Estado e estudiosos passam a centralizar seu objeto de estudo no
crescimento populacional e recursos naturais disponíveis. Marx afirma que
apesar do crescimento da população não atender às necessidades de produção
capitalista é desproporcional para sua absorção completa, ou seja, o mercado
necessitava de mais mão de obra para atender o crescimento da demanda de
produção, porém não havia recursos disponíveis para suprir as necessidades
dessa população.
[...] no capitalismo, o crescimento
harmonioso ou equilibrado é, segundo Marx, inteiramente acidental, devido à
natureza espontânea e caótica da produção de mercadorias sob o capitalismo
competitivo (1967, vol2: 295). [..,] Poderemos entender essas tensões no
processo de acumulação depende e pressupõe:
1)
A existência de um excedente de mão-de-obra,
isto é, um exército de reserva industrial, que pode alimentar a exposição da
produção [...].
2)
A existência no mercado de quantidades
necessárias (ou oportunidades de obtenção) de meios de produção – máquinas,
matérias-primas, infraestrutura física e assim por diante – que possibilitam a
expansão da produção conforme o capital seja reinvestido.
3)
A existência de mercado para absorveras
quantidades crescentes de mercadorias produzidas [...]. (HARVEY,2005, p. 44-5).
Fato
que preocupa principalmente quando voltamos os olhos para a questão dos países
subdesenvolvidos, seu crescimento descontrolado contradiz com os recursos disponíveis
e seu desenvolvimento socioeconômico não acompanha a explosão demográfica
crescente.
Nos
países desenvolvidos, como citado por DAMIANI (2011), a preocupaçãose volta com
a formatação que se é dada ao trabalho. Allen Scott, da Universidade da Califórnia,
em uma conferência realizada n Brasil em 1990, expõe a forma que estes países
estão lidando com o fator migração. Expos sobre a exploração e clandestinação
trabalhista que ocorrera neste período, tirando proveito da situação ilegal
desses trabalhadores no país, empresas impunham postos de trabalho burlando
seus direitos e pagando salários relativamente muito baixos a esta população, o
que afetou indiretamente sua economia, já que contribuiu para uma nova forma de
pobreza que surgira em um território sem perfil para tal.
O
excedente de mão-de-obra também pode ser importado do exterior. [...] Na
ausência de escravidão, a importação do excedente de mão-de-obra deve-se apoiar
na livre mobilidade geográfica dos trabalhadores. Porém, caso se conceda esse
privilégio ao excedente de mão-de-obra no exterior, é difícil nega-lo à reserva
flutuante gerada na terra natal. Diante do desemprego, a reserva flutuante
talvez emigre, especialmente se terras sem donos estiverem disponíveis em
determinada fronteira.[...] grande quantidade de mão-de-obrapode ser
aproveitada por meioo da livre migração a uma fronteira. [...](HARVEY,2005, p.
120-1).
Assim,
podemos afirmar que o homem, preso a um “ciclo vicioso” de exploração, em
outras palavras, do mesmo modo que explora e transforma a natureza é explorado,
tendo o lucro como seu único objetivo,se esquece de que acima de tudo é humano,
e tomado pela ideologia capitalista, trata seu próximo e a natureza como objetos
de obtenção de lucro. Esta relação é explícita desde a aparição da propriedade
privada e divisão de classes, porém teve seu apogeu na Revolução Industrial, que,
com o avanço tecnológico e troca do trabalho manual pelo maquinário,
desencadeou o aumento significativo da produção, resultando no uso demasiado
dos recursos naturais, como também, através da substituição por máquinas,
desvalorização do trabalho do homem, provocando desemprego e miséria.
Conclui-se então que esta é uma relação com bases historicamente fortes, ou
seja, é um processo que dificilmente apresentará mudanças, sempre existirá o
explorador, dono dos meios de produção, e o objeto explorado, cabe ao homem
então, procurar formas de amenizar esta exploração, empregando formas
sustentáveis de produção, como também criação de empregos dignos ao seu próximo.
REFERÊNCIAS
SANTOS, Douglas. A reinvenção do
espaço: diálogos em torno da construção do significado de uma categoria. São
Paulo: Editora UNESP,2002.
HARVEY, David. A produção capitalista
do espaço. São Paulo: Annablume,2005.
OLIVEIRA, Carlos Roberto de. História
do trabalho. 3ª ed. São Paulo: Ática, 1995.
DAMIANI, Amélia Luisa. População e
geografia. 9ª ed. São Paulo: Contexto, 2011.
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